24 outubro, 2016

Para analistas, inquérito contra Lula é inconsistente

 O ex-presidente Lula no Palácio do Planalto, em 2005. Foto: José Cruz/Wikimedia Commons

Luiz Inácio Lula da Silva é alvo de um inquérito aberto pela procuradoria da república. Esta é a primeira vez que o nome do ex-presidente é diretamente relacionado a um possível mal-feito. A suspeita, publicada há quase três meses pela revista Época, era de que Lula teria usado seu prestígio para conseguir contratos bilionários para a Odebrecht e outras construtoras brasileiras, em países como Cuba, República Dominicana, Angola e Gana. Parte do financiamento das obras teria sido feito via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

A procuradora Mirella de Carvalho Aguiar, responsável pelo caso, considerou as provas fracas e pediu um prazo de 90 dias para diligências. Mas, ela saiu de férias, e um procurador chamado Valdan Timbó Mendes Furtado, abriu o inquérito antes de expirada a data-limite. Na opinião do jornalista e ex-membro do conselho editorial da Folha de S. Paulo Luís Nassif, ele teve motivações políticas e pessoais.

Blindagem pessoal
Isso porque, em junho, Furtado "foi denunciado pela corregedoria do Ministério Público por deixar trabalhos atrasados". De fato, a portaria n° 62 de 3 de julho de 2015, atesta que durante 11 anos, entre março de 2004 e julho de 2015, ele "foi negligente no exercício das suas funções ministeriais, tendo em vista o atraso ao dar andamento em 245 (duzentos e quarenta e cinco) feitos que estavam sob a sua responsabilidade".

Nassif acredita que "a maneira que ele teve para se blindar foi transformar (a denúncia) em investigação antes do prazo. Agora, qualquer suspeita que vier contra ele, ele vai dizer que foi represália porque ele entrou contra o Lula". Para o jornalista, o mais importante neste momento é descobrir porque o processo caiu no colo de Furtado.

Surpresa
O Instituto Lula foi pego de surpresa pelo inquérito, já que havia pedido - e obtido - mais 30 dias para entregar a documentação exigida pela procuradoria. O prazo se encerraria em 18 de setembro, mas foi interrompido pela decisão do procurador.

Em nota, emitida logo após o vazamento da abertura do inquérito para a imprensa, a instituição afirma que "o ex-presidente Lula é alvo de um conjunto de manipulações e arbitrariedades com o propósito evidente de criar constrangimentos e manchar, sob falsos pretextos, a imagem do maior líder popular deste País no Brasil e no exterior". E pede esclarecimentos.

Repercussão internacional
Independentemente do teor da acusação, ela tem repercussão amplificada por tratar de quem trata. O estrago se estendeu para fora do país. Na última sexta-feira (17), vários jornais internacionais noticiaram o tal inquérito contra o ex-presidente Lula.

O francês Le Monde mistura essa investigação à acusação de suposto recebimento de propinas pelo líder da Câmara, Eduardo Cunha, para cravar que o “o escândalo de corrupção da Petrobras, que agita o Brasil há meses, tomou um novo rumo”. El País, BBC e Figaro também dedicaram manchetes ao caso.

Mas, para o cientista político Gaspard Estrada, da universidade parisiense Sciences Po, esse interesse da imprensa estrangeira não tardará a murchar, dada a inconsistência da acusação: "Eu duvido que essa notícia se sustente num processo mais longo porque a criação desse inquérito, na verdade, é uma repercussão de uma matéria jornalística (sobre) viagens supostamente secretas do ex-presidente Lula bancadas pelas construtoras. No entanto, essas viagens foram públicas. No próprio site do Instituto Lula, tudo isso já foi publicado no momento das próprias viagens".

Ele admite, no entanto, que, pela primeira vez o ex-presidente foi envolvido num assunto judicial e que isso "deixa uma marca" em sua biografia.

Publicado originalmente pela Radio France Internationale a 20 de julho de 2015, quando ainda não se sabia que este inquérito inconsistente era o início de um lawfare (guerra jurídica) para acabar com a reputação de Luís Inácio Lula da Silva.
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